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Dia dos Mortos na pandemia: as fases de vivenciar a morte no cemitério em tempos de solidão
Por Weverson Bezerra Silva
O ensaio fotográfico aborda o tema do Dia dos Mortos em seu contexto pandêmico ritualístico na cidade de João Pessoa (Paraíba), mais precisamente no cemitério Senhor da Boa Sentença, situado no bairro do Varadouro.
A intenção é mostrar, em experiência etnográfica, o processo de visitar os mortos como forma de ser lembrado, atentando aos processos sociais e econômicos em torno da data em tempos de distanciamento social, no primeiro Dia dos Mortos no Brasil em 2020 na presença da Covid-19. Trata-se de problematizar os processos da contemporaneidade sobre o visitar no Dia dos Mortos, com as medidas de biossegurança e as máscaras – o novo acessório no mercado das flores e da vela.
As fotografias refletem o cemitério como espaço significativo no entendimento de uma organização social, como parte fundamental de uma cultura, e ainda como testemunha da história de uma sociedade que vive a experiência coletiva de visitar os seus mortos com restrições e apoio social limitado. Nesse sentido, o cemitério é como uma construção histórica feita a partir de processos de distanciamento, assombro e higiene em torno da morte e dos mortos, além do medo da contaminação do vírus invisível.
Visando compreender os elementos que compõem o mundo social do cemitério, observo questões como o mercado dentro e fora dos muros e a presença de novos acessórios que compõem os sistemas de relações (máscaras e álcool 70), a ausência das missas religiosas, o simbolismo da solidão e o número reduzido de enlutados, como também toda a divisão de classes presente na estrutura do cemitério, que perpassa as relações dos vivos e/com os mortos, mostrando a diminuição dos serviços das limpezas dos túmulos.
Dessa forma, a percepção da dinâmica social que envolve o cemitério com as suas práticas socioculturais está associada ao contexto histórico vivenciado. E as relações construídas entre os indivíduos ajudaram a compreender o espaço do cemitério não apenas como lugar de morte, mas, principalmente, como espaço de vida, atividade social, memória e continuidade simbólica, onde os enlutados resistem no fortalecimento das suas práticas culturais mesmo com todas as formas do cenário de solidão de vivenciar esse dia.
Weverson Bezerra Silva é Bacharel e Licenciado em Ciências Sociais, mestre e doutorando em Antropologia, ambos pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), especialista em Tanatologia: sobre a morte e o morrer (FSG). Integrante do GRUPESSC - Grupo de Pesquisas em Saúde, Sociedade e Cultura (UFPB - Campus I). E membro da Associação Brasileira de Estudos cemiteirais (ABEC). E-mails: weversonbezerra@hotmail.com ou weversonsilbez@gmail.com.
Os artigos publicados na série Mobilidade Humana e Coronavírus não traduzem necessariamente a opinião do Museu da Imigração do Estado de São Paulo. A disponibilização de textos autorais faz parte do nosso comprometimento com a abertura ao debate e a construção de diálogos referentes ao fenômeno migratório na contemporaneidade.
A chamada "Mobilidade Humana e Coronavírus" é uma iniciativa do Museu da Imigração para divulgação de artigos, ensaios e materiais visuais selecionados, por meio de edital aberto entre fevereiro e abril de 2022. Dando continuidade à proposta desenvolvida na série homônima, seguiremos debatendo e refletindo sobre os impactos da pandemia para as migrações e demais mobilidades.